sexta-feira, 28 de outubro de 2016

“ELA”, a tecnologia e um roteiro muito especial

Theodore em um de seus momentos solitários frente a Samantha

Se há uma discussão constante quando se trata da vida moderna e contemporânea, é a da relação entre homem e tecnologia. É recorrente redes sociais algumas criticas relacionadas a isso (vejam só que ironia), ou mesmo na conversa de amigos e familiares ao falarem sobre como uma determinada pessoa “não sai do celular”. Her (em cartaz como “Ela” aqui no Brasil) aprofunda essa relação ao extremo, ao ponto de Theodore Twombly, interpretado por Joaquin Phoenix, se apaixonar por Samantha, sistema operacional que se manifesta por meio da voz de Scarlett Johansson.

Spike Jonze, escritor e diretor da obra, conseguiu superar o desafio de transcender um roteiro que se fosse mal trabalhado teria tudo para ser uma história comum. Não à toa o filme foi premiado como o Melhor Roteiro Original no Golden Globe Awards e no Oscar em 2014. Ele te sensibiliza na história como um todo, pois sua construção, a atuação de Joaquin, além da trilha sonora e fotografia (belíssima e futurista como o tema do filme sugerem) guiam seus sentimentos de uma forma que você considera inevitável uma paixão que realmente parece absurda.

É interessante notar a construção desse relacionamento, pois ele não acontece do nada. A história de vida de Theodore se encaminha para o isolamento de relações humanas até chegar ao ponto de se entregar a um sistema operacional. Na sua profissão de escritor, já se sentia naturalmente muito sozinho. Sua vida amorosa não andava bem após o término de seu casamento e sua relação com amigos esfriava quando ele passava momentos de instabilidade sentimental.

Joaquin Phoenix interpretou como poucos momentos felizes e melancólicos

Por tratar de um tema tão atual, ainda que tenha sido trabalhado em um tempo futuro, o longa nos traz uma série de questionamentos. Identificamos o drama de Theodore em maior ou menor escala na nossa rotina. Não a ponto se relacionar com um sistema eletrônico (ainda, vai saber o que seremos daqui alguns anos), mas compensar a nossa solidão e nossos anseios no uso de algum tipo de tecnologia, seja ela qual for. 

O filme merece ser reconhecido como um dos melhores dos últimos anos e por isso leva 4,5 cinestrelas da produção. Se você ainda não o assistiu querido leitor, não perca tempo!

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

O Shaolin do Sertão é como chuva na terra seca

A trama acontece na década de 80, Quando ainda existiam programas de vale tudo e artes marciais estavam bem em alta. Bruce Lee era um deus pra muita gente e ainda é por conta de filmes daquela época. E no Brasil então nem se fala. Bendita foi a da ascensão do VHS no país.
Na cidadezinha de Quixadá, conhecemos o padeiro Aloísio (Edmilson Filho). Aliás, padeiro por circunstância, porque em sua cabeça ele já é um artista marcial como os de seus filmes preferidos. Já na primeira sequência do filme temos um sonho acordado de Aloísio, com direito a estética de filmes setentistas chineses,  em que ele é o herói da história e salva Anésia Shirley (Bruna Hamu). Quando o protagonista volta pra realidade, descobrimos que seu interesse amoroso é  filha de seu patrão (Dedé Santana) e que a moça está prometida para Armandinho (Marcos Veras), que tem roupas, carro e jeito do riquinho filhinho de papai que todos já conhecemos. 

Aloísio é piada na cidade por seu notório amor as artes marciais. Mais ou menos a mesma coisa de quando se tira sarro de um nerd ou algo do tipo.
Uma oportunidade de redenção se apresenta quando Tony Tora Preula, conhecido em todo nordeste como lutador invencível, anuncia que sua turnê de desafios passará por Quixadá.Aloísio se prontifica para defender a honra da cidade, ao mesmo tempo que deseja ser um partido mais valioso para a filha de seu patrão. Mas ele precisava treinar. E como fazer isso? O boato era de que havia um mestre chinês isolado em algum lugar do sertão. Aloísio vai a procura e assim seu "treinamento" começa mestre.
Nesse treinamento percebemos o amor de Halder Gomes ao cinema. Referências aos antigos filmes chineses e também a outros clássicos como“Rocky – Um Lutador”, onde o protagonista também treina para uma luta contra um inimigo muito acima de seu nível, se fazem bem presentes. É meio clichê, talvez, mas é um clichê gostosinho de ver. Dá gosto torcer pro menor num dá?

O carisma do elenco, principalmente do ator Edimilson Filho é um grande ponto forte. Até quem não tem tanta intimidade com a câmera não deixa a peteca cair por conta desse magnetismo e alegria mostrados na tela. Outro ponto importante do filme é a capacidade de humor físico, de caras bocas e expressões de Edmilson. Lembra algo como uma versão cearense de Jim Carrey, mas um pouco mais sutil.
Também tem destaque Marcos Veras, que encarna muito natural o romântico de Aloísio, e também cearense. Não perde o ponto forçando o sotaque, mas o usa aliado ao "espírito" e trejeitos regionais. Esse espírito é inclusive o ponto mais forte do filme pra mim. As gírias, as ofensas, as entonações, o sotaque, as próprias piadas são algo de imersivas. Você tem a sensação de que não são atores imitando um estereótipo mas sim pessoas naturais e reais. Daría pra fazer um dicionário só do número de ofensas "cômicas" e nordestinas do filme.
Infelizmente, nem tudo é acerto. Algumas cenas se estendem demais, dando a impressão de que o diretor não teve coragem de cortar o material só com o mais importante. Tempo demais em um filme de comédia como esse pode ser mortal. É só você lembrar daquela vez que você começou a contar uma piada e esqueceu no meio do caminho. Mesmo que você enrole um pouco e depois lembre do final da história, o interesse e o timing já passaram. Outras cenas também sofrem por terem sido inseridas sem nenhum contexto. São cenas que tem sempre uma piadinha, mas por não terem vindo do nada e sem contexto acabam por não envolver e você percebe o final antes mesmo de chegar, tornando a sketch bastante cansativa. A cena da luta final também é bastante longa e tem-se a impressão que poderia ser pelo menos 2 minutos menor

Apesar de não ser perfeito, “O Shaolin do Sertão” se destaca por ser um respiro diferente da comédia do eixo Rio-São Paulo e também por ser uma homenagem ao gênero de artes marciais, que já foi tão popular no país e que hoje anda bastante esquecido Seu elenco carismático também ajuda demais e o tempero regional dão o último toque. Recomendamos e damos 3,5 cinestrelas pro longa. 3,8 se você assim como eu se identifica com os trejeitos do povo nordestino :)

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

EnCine-se: A importância da Trilha Sonora

Trilha Sonora é um aspecto importante na qualidade do filme

Olá queridos leitores! Hoje é dia de mais um texto da sessão EnCine-se, hospedada sempre neste humilde blog que trata de tudo o que é relacionado a filmes, séries e afins. Aos leitores de primeira viagem, lembramos que o Encine-se tem como objetivo elucidar brevemente aspectos técnicos do cinema. Com um pouquinho mais de conhecimento, podemos aproveitar ainda mais os filmes que assistimos, além de ter o mínimo embasamento para avaliar uma obra.

Nesta semana vamos falar sobre a importância da trilha sonora. Você já imaginou o incômodo que seria assistir um filme inteiro sem som algum? Ainda que este filme não tivesse diálogo, como era comum nos primeiros anos da arte das telonas, havia a preocupação com a sonorização aliada à imagem. Ao menos as teclas de piano davam o ar da graça, inserindo-se as imagens em preto e branco.

Nesta fase, a música erudita era predominante, mas ao longo dos anos a música popular também ganhou destaque e hoje ambas dividem espaço nas caixas de som das telonas. Mesmo as músicas já criadas e inseridas em um filme tornam-se parte do processo e até se reconhece determinado título somente ao escutá-la. Ninguém ouve My Heart Will Go On da Celine Dion sem associar automaticamente ao Titanic, não é?

É conferida tamanha importância a musica no cinema devido ao aspecto emocional que ela traz consigo e que é transpassada ao telespectador. Sua sintonia, seja de acordes alegres ou melancólicos, está sempre em conexão com o que se vê, ajudam a ditar o ritmo das ações e enriquecem ainda mais a experiência cinematográfica. Quando se compõe uma trilha que fará parte de um filme, pensa-se nela com o intuito de passar exatamente os sentimentos que uma determinada cena pede.

Os Oito Odiados ganhou o Oscar de Melhor trilha sonora em 2016

Se visualmente uma determinada sensação pode substituir a fala pelo artista por meio da sua linguagem corporal, seja um gesto ou um olhar, por exemplo, a falta que a sonoridade faz é realmente insubstituível. A trilha está tão estritamente conectada ao filme que há uma categoria dedicada a ela no Oscar. O vencedor neste quesito em 2016 foi Os 8 odiados, de Quentin Tarantino. Há também a melhor canção original, que neste ano quem levou foi "Writing's on the wall", de Sam Smith (do filme 007 contra Spectre), além de Melhor mixagem de som e Melhor edição de som (ambas vencidas este ano por Mad Max).


Portanto caro leitor, nas próximas idas ao cinema, aguce a sua sensibilidade não só a visão e dê ouvidos ao que a obra traz. Bons filmes!

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Sétima temporada de The Walking Dead estreia no próximo domingo com atenções voltadas as ações de um novo vilão

Abraham, Maggie, Rick e Sasha ajoelhados diante de Negan após serem capturados


Desde “Last Day on Earth”, último episódio da sexta temporada que foi ao ar no dia 3 de abril deste ano, os fãs de The Walking Dead esperam ansiosamente para saber quem do grupo comandado por Rick Grimes (interpretado por Andrew Lincoln) foi escolhido por Negan (Jeffrey Dean Morgan) para ser vítima da sua companheira Lucille, nome dado ao seu taco de baseball de estimação envolvido por arame farpado. A expectativa é que o episódio “The Day Will Come When You Won’t Be”, que irá ao ar no próximo dia 23 de outubro na FOX traga essa resposta.

O final em primeira pessoa impediu que os telespectadores vissem quem foi que morreu à pauladas e enlouqueceu todos os fãs da série, ainda mais depois de uma incrível interpretação de Jeffrey. Diversas teorias, enquetes e notícias circularam a internet desde então. De todo modo, como a série é baseada nas HQ’s e não necessariamente seguem os mesmo destinos dos personagens, ficamos todos na expectativa.

Cena em primeira pessoa do personagem morto por Negan vendo Lucille

Além dessa questão central, outras tantas devem se desenvolver e serão reveladas ao longo da sétima temporada. Como Rick e companhia vão reagir após a morte de um dos seus? O histórico de Rick é favorável diante dos principais vilões durante a série. De alguma forma ele sempre ganhou as grandes batalhas que enfrentou, seja diante do Governador ou em Terminus, por exemplo, fator que dá a ele uma confiança que agora está visivelmente quebrada. Será interessante ver como ele vai reagir após ter terminado de joelhos e completamente aterrorizado diante de Negan, algo incomum até então para um dos principais personagens da série.


Negan, o vilão interpretado por Jeffrey Dean Morgan, um dos destaques da sétima temporada


Negan também é um personagem no qual todos os fãs desejam ver a evolução. É um típico vilão falastrão, sarcástico, sádico. Líder do grupo dos Salvadores, surge no momento em que o grupo de Rick anseia por voltar a viver em sociedade e colocar mais pessoas sob os seus domínios, sacando os seus pertences para viver sob suas regras.


E aí leitor, deixe nos comentários quais são as suas expectativas para o episódio do próximo domingo.

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Vá se preparando porque hoje começa a 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

Começando nesta quinta-feira (20), a tradicionalíssima Mostra já escancara que política é um dos temas centrais deste ano. No próprio cartaz oficial, criado pelo diretor italiano Marco Bellocchio e baseado no filme Bom Dia, Noite, punhos cerrados, comunismo e igreja formam uma arte provocativa. 


O festival conta com 322 filmes, entre longas e curtas, vindos de mais de 50 países. As obras serão exibidas no decorrer das duas semana do evento. Se preocupando em dar também à população mais carente acesso a cultura ,alguns CEUs receberão sessões gratuitas e direcionadas ao público jovem.
De destaques temos O Nascimento De Uma Nação, do cineasta Nate Parker, obra sobre a libertação dos escravos nos Estados Unidos. Além deste, também chamam atenção o candidato francês ao Oscar de "Melhor filme estrangeiro" Elle e o premiado documentário nacional Cinema Novo, do cineasta Eryk Rocha, filho do monstro sagrado Glauber Rocha.
Na parte das Apresentações Especiais, a curadoria do evento selecionou alguns títulos brasileiros ainda inéditos em São Paulo; clássicos do cinema mundial e homenagens ao já citado Marco Bellocchio,  o diretor polônes Andrzej Wajda, William Friedkin, diretor de O Exorcista e o brasileiro Antônio Pitanga.
A cerimônia de abertura ocorreu ontem, no Auditório do Parque Ibirapuera. Logo após a abertura, o filme Belos Sonhos foi exibido pela primeira vez no Brasil.
 Mostra de São Paulo segue até o dia 2 de novembro, com ingressos que podem ir de R$ 18 reais por um filme a pacotes para a mostra inteira que custa R$ 460.
E pra dar um gostinho, confere a vinheta:
Confira todos os locais de exibição no site oficial

terça-feira, 18 de outubro de 2016

O que vale mais, dinheiro ou memórias?

Novo filme de Kleber Mendonça Filho, do também incrível o Som ao Redor, Aquarius é a história da luta do antigo contra o novo, quase sempre vencida pelo novo. 
No meio desta luta temos Clara (Sonia Braga) que luta continuamente para preservar seu lar em um tradicional, mas já antiquado edifício em sua cidade. Mas vamos por partes.


A película inicia em um flashback com uma tomada aérea de uma praia. Ao longe vemos um carro correndo pela areia e fazendo manobras. Dentro desse carro temos jovens adultos se divertindo e rindo como jovens adultos costumam fazer. O carro para e uma das jovens decide mostrar uma música que seria a sua aposta para o hit do ano. Todos param pra ouvir Another One Bites the Dust da banda Queen. Enquanto todos curtem a música a câmera passeia por dentro e fora do veículo. Em determinado momento nos é mostrada um close da placa do carro onde se lê Recife tremendo. Com essa pequena passagem o diretor destaca tanto a cidade onde a trama se passa quanto o grave dançante da canção tocada. A música é extremamente importante pra esse filme




Os jovens voltam pra casa e adentram uma festa. Descobrimos que a jovem conhecedora de música é Clara, jornalista musical, esposa, mãe, sobrevivente de um câncer e dona do apartamento em que está ocorrendo a comemoração. Depois dessa que é uma das cenas mais interessantes do filme (não podemos falar muito porque perde um pouco da graça) o filme volta para os dias atuais e a história desenrola.
Clara ainda é dona do mesmo apartamento, mas hoje ele é cobiçado por uma imobiliária, que já adquiriu todos os demais imóveis do prédio. O objetvo da imobiliária é derrubar o prédio e construir um novo mais moderno. A recusa de Clara é o que representa a luta entre a nostalgia do lar onde seus filhos foram criados e viveu por décadas contra a ambição da especulação imobiliária que deseja o dinheiro que o novo empreendimento dará. É uma metáfora pela preservação da memória de nosso país. Até mesmo a escolha da protagonista representa isso. Sônia Braga, símbolo dos anos 80, mostrando que não é ultrapassada dando uma atuação invejável para qualquer atriz.
Importante ressaltar que essa luta pela preservação não é uma ode ao ódio pelo novo. 

Clara ouve músicas em seus LPs, mas como diz no filme, também escuta um mp3. Tudo tem seu momento.

Mas Aquarius não se limita a mostrar ao talento de Sonia e à valorização da nostalgia. Comentários sociais sobre a ganância, a hipocrisia, a luta de classes e a sexualidade em diversos momentos da vida, mesmo na velhice, são ácidos, pontuais, mas sem forçar a barra. Não são exagerados e nem parecem que foram inseridos apenas pelo politicamente correto.



A trilha sonora é incrível e faz ligação com a prórpia protagonista. Como jornalista musical, o conhecimento de Clara brilha enquanto ela nos mostra, com muito afeto, belas canções no decorrer do longa. O filme também é  cheio de closes e enquadramentos que impressionam seja pelo modo de detalhar algo, seja pela maneira de surpreender uma expectativa, referenciando o modo de se filmar de diretores mais antigos mas ao mesmo tempo com uma criatividade e leveza que são um ponto positivíssimo de Kleber Mendonça Filho

Em mãos menos competentes seria uma história comum. Sem grandes momentos de clímax ou coisas do tipo. Mas a junção do olhar detalhista do diretor e da atuação MAGISTRAL de Sônia Braga faz com que a história transcenda do comum para o extraordinário. Extremamente recomendado.

O que vale mais, dinheiro ou memórias? Crítica de Aquarius

Novo filme de Kleber Mendonça Filho, do também incrível o Som ao Redor, Aquarius é a história da luta do antigo contra o novo, quase sempre vencida pelo novo. 
No meio desta luta temos Clara (Sonia Braga) que luta continuamente para preservar seu lar em um tradicional, mas já antiquado edifício em sua cidade. Mas vamos por partes.


A película inicia em um flashback com uma tomada aérea de uma praia. Ao longe vemos um carro correndo pela areia e fazendo manobras. Dentro desse carro temos jovens adultos se divertindo e rindo como jovens adultos costumam fazer. O carro para e uma das jovens decide mostrar uma música que seria a sua aposta para o hit do ano. Todos param pra ouvir Another One Bites the Dust da banda Queen. Enquanto todos curtem a música a câmera passeia por dentro e fora do veículo. Em determinado momento nos é mostrada um close da placa do carro onde se lê Recife tremendo. Com essa pequena passagem o diretor destaca tanto a cidade onde a trama se passa quanto o grave dançante da canção tocada. A música é extremamente importante pra esse filme




Os jovens voltam pra casa e adentram uma festa. Descobrimos que a jovem conhecedora de música é Clara, jornalista musical, esposa, mãe, sobrevivente de um câncer e dona do apartamento em que está ocorrendo a comemoração. Depois dessa que é uma das cenas mais interessantes do filme (não podemos falar muito porque perde um pouco da graça) o filme volta para os dias atuais e a história desenrola.

Clara ainda é dona do mesmo apartamento, mas hoje ele é cobiçado por uma imobiliária, que já adquiriu todos os demais imóveis do prédio. O objetvo da imobiliária é derrubar o prédio e construir um novo mais moderno. A recusa de Clara é o que representa a luta entre a nostalgia do lar onde seus filhos foram criados e viveu por décadas contra a ambição da especulação imobiliária que deseja o dinheiro que o novo empreendimento dará. É uma metáfora pela preservação da memória de nosso país. Até mesmo a escolha da protagonista representa isso. Sônia Braga, símbolo dos anos 80, mostrando que não é ultrapassada dando uma atuação invejável para qualquer atriz.
Importante ressaltar que essa luta pela preservação não é uma ode ao ódio pelo novo. 

Clara ouve músicas em seus LPs, mas como diz no filme, também escuta um mp3. Tudo tem seu momento.


Mas Aquarius não se limita a mostrar ao talento de Sonia e à valorização da nostalgia. Comentários sociais sobre a ganância, a hipocrisia, a luta de classes e a sexualidade em diversos momentos da vida, mesmo na velhice, são ácidos, pontuais, mas sem forçar a barra. Não são exagerados e nem parecem que foram inseridos apenas pelo politicamente correto.



A trilha sonora é incrível e faz ligação com a prórpia protagonista. Como jornalista musical, o conhecimento de Clara brilha enquanto ela nos mostra, com muito afeto, belas canções no decorrer do longa. O filme também é  cheio de closes e enquadramentos que impressionam seja pelo modo de detalhar algo, seja pela maneira de surpreender uma expectativa, referenciando o modo de se filmar de diretores mais antigos mas ao mesmo tempo com uma criatividade e leveza que são um ponto positivíssimo de Kleber Mendonça Filho


Em mãos menos competentes seria uma história comum. Sem grandes momentos de clímax ou coisas do tipo. Mas a junção do olhar detalhista do diretor e da atuação MAGISTRAL de Sônia Braga faz com que a história transcenda do comum para o extraordinário. Extremamente recomendado.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

EnCine-se: Spin Off


Olá pessoal! Sejam bem vindos mais uma vez a sessão Encine-se, espaço deste humilde blog dedicado a explicação de alguns termos encontrados quando falamos de cinema séries, e porque não até mesmo as telenovelas.

Nos textos anteriores, o Renan Kalil escreveu coisas muito interessantes sobre Roteiro e fotografia. Hoje vou falar do termo Spin-off, que não é necessariamente algo relacionado a técnica propriamente dita, como nos dois assuntos já tratados, mas é algo que sempre aparece nos assuntos relacionados as tele produções e é importante entender.

O spin off nada mais é do que um filme ou série derivada de um outro filme ou série. Neste mesmo blog, falamos sobre a série “Better Caul Saul” como Spin-Off de “Breaking Bad”, ou seja, totalmente inspirada nela, inclusive com alguns dos mesmos personagens interpretados pelos mesmos artistas.

Interessante nisso tudo é que a série denominada como um Spin-off pode ter como personagem principal alguém que era secundário no passado, além da possibilidade de ser ambientada temporalmente antes, durante ou depois da original (como é o que geralmente acontece). Por tudo isso, a lógica é que o spin-offs se tornem viáveis por conta do sucesso alcançado na produção anterior. Em relação aos filmes, o mais comum é o relançamento sequencial (os famosos "título do filme" + 1, 2, 3 4 - O retorno, 5 - O final).


E aí caro leitor, Que tal um spin-off desta conversa? Conte-nos nos comentários quais spin-offs conhece e quais os que mais gosta? 

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Relatos Selvagens é um filme sobre vingança. Aliás, um não. Seis!

O longa é dirigido por Damián Szifron e é dividido em seis episódios. A única coisa que liga todos eles é a motivação pela qual a história gira: a vingança.

Na primeira história, um avião acaba de decolar e um dos passageiros tenta dar em cima da sua vizinha de vôo. Com o tempo, eles percebem que tinham em comum um amigo chamado Gabriel Pasternak. Ouvindo a conversa, a passageira da poltrona da frente também relata conhecer a mesma pessoa. Não se pode falar mais sem contar o final, mas com certeza você vai gostar. Confia ;)



Na sequência, uma jovem funcionária de uma lanchonete de beira de estrada recebe a visita de um homem - como cliente - que no passado acabou com sua família e que não se lembra dela. Nos próximos episódios temos dois brigões de trânsito, um pai rico que tenta livrar o filho da cadeia por atropelar uma mulher grávida, um homem que tem seu carro guinchado injustamente e uma noiva que descobre uma traição no dia de seu casamento.

O roteiro também faz algumas críticas sociais no decorrer dos episódios. Aproveitadores, corrupção das elites, burocracia exagerada e até a instituição do casamento são alfinetados com uma sutileza que dá gosto de ver. O famoso tapa na cara com luva de pelica. 

Podemos notar ótimas influências nesse filme, como por exemplo, o clássico Um Dia de Fúria, que tem uma espécie de releitura no que considero a melhor história desse conjunto: o personagem vivido pelo "faz tudo" do cinema argentino, Ricardo Darín, lentamente se revoltando com a intransigência do sistema de trânsito é... Impagável. 



Um dos principais méritos do filme é conseguir equilibrar dois tons que permeiam o roteiro o tempo todo - um  mais leve e engraçado e outro mais tenso, pesado, vingativo. Tudo sem perder os pés na realidade. Os absurdos mostrados fazem bastante sentido, já que a loucura da situação não vem do nada, mas sim é construída lentamente. 

Em conclusão, a obra é uma boa pedida para quem está à procura de um bom filme fora do mainstream. Além de ser um bom lembrete de que sempre devemos dar uma conferida no que vem do cinema hermano. Recomendadíssimo!

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Invertendo a relação de maior poder financeiro com sucesso esportivo, Moneyball traz a revolução estatística ao esporte

Brad Pitt interpreta Billy Beane, lendário gerente geral do Oakland Athletics

Não é novidade para os brasileiros o discurso de que quem conhece de bola de verdade é o boleiro, o ex-jogador que viveu a experiência dentro de campo. Essa abordagem perdura até os dias de hoje na análise esportiva e mesmo na escolha de comissões técnicas dos clubes. Não que essa experiência seja descartável, pois a vivência prática é realmente um fator muito importante, mas há outros tantos a serem levados em consideração.

Ainda estamos engatinhando quando o assunto é análise de desempenho e uso da estatística no esporte quando negamos a força dos números. Quanto mais informações, mais base se tem para a tomada de decisões técnicas. Isso é um fato, seja para o basquete ou mesmo o futebol. É claro que há múltiplas variáveis para cada tipo de esporte, mas encontra-las e saber usá-las torna-se fundamental quando se trata de alto rendimento. No mundo do baseball norte-americano não era muito diferente, um universo fechado e restrito apenas a ex-atletas e dirigentes seculares comandando e discutindo o esporte com os mesmos conceitos de sempre. E é a partir daí que vamos discutir a importância do Moneyball - O Homem que mudou o Jogo.

O filme é baseado em fatos reais, inspirado no livro Moneyball: The Art of Winning an Unfair Game, de Michael Lewis, lançado em 2003 (e em 2015 em português pela editora Intrinseca). Trata-se do relato da história de Billy Beane (Brad Pitt), gerente geral do Oakland Athletics. Com um dos orçamentos mais baixos da liga, Billy não tinha o poderio financeiro para contratar os atletas mais renomados da MLB (Major League Baseball – a grande liga da modalidade nos Estados Unidos). Competitivo que era, não aceitava que isso impusesse ao seu time o mero status de coadjuvante. Buscou então parceria com Peter Brand (Jonah Hill), e deu a ele carta branca para desenvolver os seus diversos métodos estatísticos para analisar o real desempenho de atletas, contrariando a velha guarda de sua equipe técnica.

Billy Beane e Peter Brand analisando o desempenho de possíveis contratações

Peter começou a fornecer todas as informações que Billy precisava para negociações mais baratas e efetivas, aquelas que o senso comum dos dirigentes podiam ver. Esses dados apontavam o que somente o olhar não podia analisar e assim ele começou a fazer com que o pobre Oakland A’s conquistasse grandes resultados, completamente desproporcionais a sua baixa folha salarial, ano após ano. Enquanto seus adversários pagavam milhões por grandes estrelas, a dupla encontrava em jogadores das divisões inferiores habilidades muito semelhantes e que não haviam recebido nenhuma oportunidade.

Outro ponto muito legal do filme é que essa barganha fazia dos dias de negociações uma verdadeira loucura, tornando o escritório da equipe uma espécie de grande bolsão do mercado financeiro. É muito interessante ver os bastidores do esporte e o seu lado “bolsa de valores”.

A grande barreira para o entendimento pleno do filme (e talvez a única, mas não desistam!) é o conhecimento básico do baseball. Primeiro porque o roteiro ajuda bastante, trazendo algumas características do esporte para uma linguagem que o grande público consegue entender, além de estar focado muito na dramática de Billy Beane, um cara tão excêntrico e bem interpretado pelo Brad Pitt.

Beane, o homem que mudou o jogo

Falando um pouco da minha própria experiência, foi depois de assistir ao filme que eu passei a admirar este esporte e o melhor, enxergar todos os outros de forma ampla e menos estigmatizada. A gestão racional de Billy não é só um exemplo de sucesso esportivo, mas também administrativo. Pra quem é fã de esporte, seja qual for, Moneyball é simplesmente imperdível.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

EnCine-se: Fotografia no cinema

Olá, senhoras e senhores. Tudo bem?

Voltando com a sessão que ensinamos (e aprendemos também) um pouquinho sobre a sétima arte, nós vamos falar sobre algo que é bastante importante no que torna o nosso cinema a arte que tanto amamos: a fotografia.

Quando seu amigo que curte cinema diz “nossa que fotografia bonita” ele está querendo falar sobre o conjunto de ângulo, proximidade da câmera, cores mais aparentes na tela, movimentação que a câmera tem na cena, entre outros. Quando juntamos todos esses fatores, temos quase como que uma história complementar.

Imagine que você está vendo um filme e que acontecerá uma cena de ação. A câmera poderia ficar apenas parada, de longe e mostrando toda ação de uma vez só. Mas se você parar pra pensar, duvido que lembre de um filme que tenha feito isso. Porque isso não dá emoção, nem adrenalina. A câmera em filmes de ação é sempre rápida, ás vezes tremida, sempre se movimentando. Isso nos dá a sensação de que nós estamos nos movimentando juntos. Um filme de terror muitas vezes escolhe mostrar o personagem no primeiro plano e próximo, e ao longe em algum canto da tela o vulto. É o que nos causa a tensão e aquela vontade de gritar “ali atrááááááás".

Se o roteiro diz o que vai acontecer no filme, a fotografia diz como o que acontece é mostrado em tela. E isso importa muito!

Pra exemplificar:

Em "O Regresso" nós temos um protagonista em primeiro plano onde conseguimos ver o cansaço e desesperança do personagem, e ao fundo a extensão da natureza. O tom azulado também dá a sensação de frio congelante e para alguns a solidão que ele se encontra


Em A Vida de Pi, nos momentos que a história está acontecendo nas memórias, as cores ficam muito mais vivas e brilhantes. Seria como lembrar de algo melhor do que foi de fato. Com nostalgia.

E por último: A harmonia estética centralizada de Wes Anderson. O diretor adora colocar o ponto principal do foco exatamente no meio da cena. No vídeo abaixo você confere o efeito dessa escolha:




Então, em resumo, fotografia no cinema é a maneira que o cineasta escolhe cena, e com que tipo de sentimento ele quer que essa cena apareça no produto final que é o filme que assistimos. 


Até mais e um bom filme pra você!

terça-feira, 4 de outubro de 2016

DIvertidamente: Cinco Sentimentos que nos guiam a um universo de possibilidades


Não é de hoje que os filmes infantis fazem a cabeça dos adultos. Ao menos fazem parte de suas rotinas quando existe uma criançada em casa ou na convivência próxima. Dentre eles, Divertidamente (2015) é um filme que pode fazer a cabeça dos baixinhos, mas também dos marmanjos, a ponto de nos perguntar: "É mesmo um filme feito para crianças?". O longa é realmente divertido (como seu nome sugere), sensível às sensações e relações humanas, além de maduro o suficiente para lidar com tudo isso.

É possível sentir tudo isso por meio das experiências interpretadas dentro da cabeça de Riley, que vive diversos conflitos internos que começam pela mudança da família da gélida Minnesota, onde era jogadora de Hockey, para a quente Califórnia. Na mente da garotinha de apenas 11 anos, há um universo controlado por cinco sentimentos principais: Alegria, tristeza, medo, raiva e repulsa (a nojinho). A cada situação vivida, cada um dos sentimentos tenta tomar o controle e agir à sua maneira. Quem nunca teve um sentimento tomando conta de suas ações em determinada ocasião? Somos movidos por eles o tempo inteiro, em maior ou menor intensidade.


A verdade é que se muda a fase da vida, mas sempre continuaremos lidando com esse "conflito interno" frente às situações que a vida nos coloca. Tentamos posicionar à frente o sentimento mais apropriado num determinado momento (isso quando eles não tomam o controle primeiro). Fato é que as problemáticas infantis nos trazem uma baita nostalgia e nos fazem pensar como construímos nossa linha de conduta sentimental ao longo dos anos.

O pior de tudo é aquele cantinho obscuro dos sentimentos que mais nos afligem e nos trazem medos. De forma lúdica é possível se aventurar no subconsciente de Riley, colocando nossos próprios temores e fazendo um exercício paralelo de relembrar como lidamos com isso (mas sem crise!).

A maioria dos filmes infantis criam ou exploram universos externos, mas mesmo que humanizem seus personagens não abordaram de forma tão profunda os sentimentos humanos como Divertidamente. Se já não bastasse isso, a mensagem que a animação deseja passar é ainda mais incrível. Ao contrário do senso comum, que diz que devemos evitar alguns sentimentos, o filme mostra que há espaço suficiente e momentos em que se deve respeitar cada um deles ou até mesmo senti-los de forma compartilhada, como um choro de alegria por exemplo.